Hoje avancei um pouco mais, e trouxe um assunto bem pertinente, que é sobre a conceituação e estudo do delito. É imprescindível compreender toda a evolução histórica e dogmática, para compreender como fixou-se a ideia moderna de delito e crime.
Teoria geral do
delito
A importância de se
estudar a teoria do delito, é averiguar, através de questionamentos e
observância de circunstâncias, se houve um delito ou não, ou se tal se
configura como um. A ideia central do delito se baseia na conduta, que deve ser
seu objeto de estudo. Na sua busca, utilizamos diversos conceitos
estratificados, ou seja, aqueles conceitos nos qual utilizam diversas camadas
de pequenos conceitos para definir um todo. Assim, a teoria do delito se
deleita em uma corrente unitária, onde seus partidários afirmam o delito ser
apenas uma infração punível; e uma corrente estratificada, que afirma existir
diversas análises e posicionamentos do estudo para a definição do delito.
Sabe-se que o direito penal moderna utiliza uma corrente estratificada,
derivada de uma série de representantes.
Quando
colocamos no plano real, observamos que delito é toda a conduta humana, porém,
sabe-se que não são todos os tipos de conduta que interessam ao direito penal.
Assim, o delito precisa estar posto na codificação, demonstrando que ele é
típico. Chamamos de típico, o fato que está descrito na legislação. Desta
forma, temos duas características do delito: Genérica (conduta) e específica
(tipicidade).
A
partir disso, sabemos que um delito é dado por uma conduta, essa conduta
precisa ser então típica, estar prevista na legislação, (tais condutas, se dão
na parte especial do CP, que se dá do art.121 até 361, onde especifica cada
tipo de conduta, correspondente a um bem jurídico) onde ela deve ser seguida ou
evitada de ser cumprida. Sabemos que há algumas condutas, nas quais afastam
essa tipicidade, onde não há hipótese da conduta, pela falta de vontade, que
ocorre nos art. 13 ao 28 do CP. Também, há os casos de exclusão da ilicitude
(que afasta a ilicitude da conduta, sendo pelo Estado de necessidade, legítima
defesa e em estrito cumprimento de dever legal no exercício regular do direito,
nos Art.23, 24, 25 do CP, bem como a inimputabilidade penal, que seria não
poder atribuir responsabilidade sobre uma conduta a alguns agentes, como os
doentes mentais ou com desenvolvimento mental incompleto ou retardado, menores
de 18 anos, por emoção e paixão e embriaguez, contido nos Art. 26, 27 e 28 do
CP).
Além
da tipicidade, o delito precisa ser antijurídico, sendo a antijuridicidade, uma
qualidade da conduta, sendo contrária ás normas dispostas na legislação, onde
estas se encontram harmonicamente com o sistema e quando descumpridas, causa
uma desorganização. Após, é preciso então se questionar se o delito é culpável,
ou seja, o agente poderia ter agido de uma maneira diferente daquela? Tal
culpabilidade, se associa as duas motivações da conduta, que é o dolo ou a
culpa. Se caracterizado a reprovabilidade do ato, considera-se então um delito.
Primeiramente
identificamos uma conduta delitiva, após comprovamos sua tipicidade, após sua
antijuridicidade e por fim, comprovamos sua culpabilidade. Não há conduta
delitiva sem esses três elementos atuando harmonicamente em conjunto. A
tipicidade e antijuridicidade atuando juntos, criam apenas a ideia de injusto
penal, onde não se configura delito. Só haverá delito, quando comprovado esse
injusto penal, haver a característica da culpabilidade, que dá a ideia do
agente. Essa, é uma análise analítica do direito penal.
A
ideia do delito tem suas primeiras raízes de estudo com a filosofia de Hegel,
onde ele analisa o autor da conduta, para atribuir certa relevância penal á
ela. Assim, os homens livres, que poderiam participar ativamente da comunidade,
eram aqueles imputáveis, enquanto os demais, eram considerados desnecessários.
Após, passou a criar um lado objetivo e um lado subjetivo da conduta,
atribuindo a tipicidade e antijuridicidade como coisas objetivas, que acontecem
externamente, enquanto a culpabilidade seria algo mais subjetivo, no que tange
ao interior, á vontade, pois nela se identifica realmente o sentido do crime.
Claro que com o passar dos anos isso foi refutado.
A
teoria do delito passou por algumas evoluções:
-Concepção Causalista (de Von Lizt);
Aqui, ele traçava dois nexos, onde o injusto
(tipicidade e antijuridicidade, que primeiramente eram confundidas, devendo se
estabelecer um outro quesito, que se enquadraria a punibilidade, que nada mais
seria do que a submissão de uma pena em uma conduta) e a culpabilidade (que era
psicológica). Esta teoria, afirmava que a culpabilidade se referiria ao dolo
(quanto a pretensão de se atingir a antijuridicidade e causar um dano social) e
a culpa(causada pela negligência, imperícia ou imprudência, onde deveria
estabelecer um nexo psicológico quando aos efeitos de tal conduta). Ela surge
contraponto o idealismo de Hegel, onde ocorre um giro filosófico, para buscar
uma certeza para a ciência do direito, e essa certeza seria alcançada pelos
dogmas, utilizados como métodos, pois como acabara sendo influenciada pelas
ciências naturais, acabou exigindo esse método. A conduta é um movimento físico
que acaba causando uma modificação no mundo exterior, onde primeiro se
identificava o lado objetivo (a conduta) e depois o lado subjetivo (dolo/culpa).
Desta forma, a conduta assume a ideia de um movimento voluntário que modifica o
mundo exterior , assim não se encaixava aqui a ideia da omissão, pois ela não
era vista a partir desse conceito. Aqui, conduta e resultado são ligados por um
nexo de causalidade, recebendo influências do positivismo jurídico, que
afastava certas valorações dadas antes pela filosofia e sociologia.
-Concepção Neoclássica: Valores/ Cultura
Com a
concepção neoclássica, influenciada pelo neokantismo, há uma pequena ruptura entre o paradigma estabelecido
pela concepção clássica ou causualista de delito. A ideia de objetividade e
subjetividade é quebrada, se estabelecendo novos meios de entendimento das
partes. Ela não é vista apenas de forma fria, mas compreendendo a existência de
uma normatividade e de valores. Aqui, passa a haver uma influência muito grande
da normatização, bem como a influência dos valores e da cultura, na definição
do delito. A tripartição conceitual de um delito ser típico, antijurídico e
culpável se manteve, alterando apenas alguns aspectos deles. O conceito de ação
foi modificado, para que pudesse abarcar as ideias de omissão e tentativa,
porém, continuando ser a parte mais frágil do estudo do delito. A tipicidade
afasta um pouco a ideia de objetividade, tento um caráter normativo, que
encerram com um conteúdo de valor, reconhecendo ainda que há elementos
subjetivos presentes nela. A antijuridicidade ganha um caráter material, não
sendo apenas aquela conduta contrária ao sistema que acaba causando uma
desarmonia, mas que agora, deveria também causar um dano social. Assim, o
injusto é graduado, onde a pena culminaria de acordo com a lesão que causaria,
além de desenvolver certas causas de lesão que não caberia punição penal. A
culpabilidade ganha uma nova definição, que se pautaria na ideia de
reprovabilidade da conduta cometida pelo agente.
-Concepção finalista: Hans Welzel
Nesta
concepção, ele reestrutura toda a teoria geral do delito. Ele passa a atribuir
um caráter mais normativo. Ele procura eliminar essa injustificável separação
entre os elementos objetivos e subjetivos da ação. Essa concepção puramente
normativa, se dá pela ideia de que o dolo e a culpa, não podem mais integrar a
ideia de culpabilidade, onde estes são recolocados como gêneros de conduta
(ação), e a culpabilidade vista como a reprovabilidade do agente. Toda ação há
uma vontade e um fim, ambas andam juntas. Assim, o dolo e a culpa passam a ser
parte do injusto e não da subjetividade da culpabilidade, onde esta, conservou
apenas circunstâncias que criam a reprovabilidade, porém o objeto de reprovação
se mantém da ideia da ação e do injusto penal (tipicidade e antijuridicidade).
Para ele, só há crime, se houver culpabilidade, mantendo ainda a mesma
estrutura de delito: Conduta típica, antijurídica e culpável. A culpabilidade é
toda reestruturada, como se percebe, onde, a reprovabilidade por parte da
culpabilidade não possui mais uma relação psicológica, o conteúdo da vontade,
que passa a ser parte do injusto ( tipicidade e antijuridicidade), e essa
reprovabilidade é definida como a possibilidade do agente ter agido de outra
forma. Em toda conduta há um fim, e na culpa esse fim é lícito, o que acaba
solucionando o problema clássico.
-Concepção funcionalista
Aqui,
alguns autores preferiram não adotar a concepção finalista, seguindo
semelhantemente sua sistemática. O que se dá, é que alguns consideram o dolo
como o tipo e o outros consideram como parte da culpabilidade, tendo ainda os
que o associam duplamente. Não há uma modificação ou estudo dos marcos
principais do direito penal, apenas atribuem e se orientam pela função mais fácil
para solucionar os casos. Ele se baseia em escolher uma função do direito penal
que influencia o sistema todo, para assim, associar cada elemento da teoria á
sua função. Se tal função não for cumprida, ela é falha e deve ser revista para
preservar a legalidade. As normas são orientadas pela função da pena, em
conformidade com as políticas criminais.
-Concepção Teleológico- Roxin
Aqui,
entra em questão uma comparação entre os elementos do delito, com os princípios
basilares do direito penal. A tipicidade corresponderia ao princípio da
legalidade e a antijuridicidade corresponderia ao princípio de intervenção
mínima e a culpabilidade com o próprio princípio da culpabilidade. Há um
ordenamento que me impede de cometer crime, criando a prevenção e proteção dos
bens e princípios jurídicos. Assim, deve-se proteger esses bens, cumprir a finalidade da pena. Manter o
sistema prevenido gera a pacificação social, e disso, cria a ideia da
associação dos elementos com os próprios princípios. Sabe-se que nem todas as
condutas interessam, ela deve ser primeiramente típica e antijurídica. Pois
aqui ele traça a ideia de que conduta é toda a manifestação de personalidade,
daquilo que sai do meu espírito, sendo o que eu tenho noção do que faço e do
que considero certo.
-Concepção do funcionalismo sistêmico
Nesta,
busca proteger a norma. Jakobs, estabelece que a função do direito penal é
manter o sistema estabilizado, e desta forma, ele afirma então que não existe
conceitos envoltos da ideia do delito, pois tudo é fruto da própria função do
direito penal. Pois os conceitos ficam a mercê de quem irá interpretar, sabendo
que também, para cada indivíduo e sua ação, os conceitos são aplicados de
maneiras diferentes, o que torna tal ideia lógica insegura em seu ponto de
vista. Assim, para solucionar tal problema, ele sugere que a função do direito
penal estabelecida dogmaticamente, seja normatizada, onde o sujeito não é mais
aquele que pode criar ou impedir um fato, mas aquele que se torna competente
para isso.
-Concepção significativa
Esta
parte da ideia da filosofia da linguagem. Certos interesses se perdem devido as
mudanças dos padrões, pois eles se alteram constantemente, mantendo sempre um
sistema estático, onde devemos pensar no padrão que estamos inseridos e o que
nele ocorre, se é do interesse do direito penal para tirar dele seu
significado. A validade das normas se dá pelo ajuste dos interesses e o sentido
dele para ser amparado pelo direito penal. Aqui se observa as circunstâncias ,
retira de algo todos os seus sentidos existentes. Assim, acaba dependendo do
caso concreto, para extrair dele seu sentido no momento da aplicação das normas
penais, onde deve-se haver um processo
argumentativo (que é uma regra interpretativa e argumentativa que podem
coincidir ou ser contrários), um consenso persecutório punitivo ( Onde se deve
compreender para poder aplicar, onde devemos fazer uma interpretação para fazer
uma análise e punir). Parte da ideia de Vives Antón, onde ele afirma que a
conduta é a interpretação que pode dar-se dos comportamentos humanos, segundo
os distintos grupos de regras sociais, sendo o que conseguimos interpretar, o
sentido que posso extrair dela.
Referências
-Manual
de Direito Penal-Parte geral: Eugenio Raul Zaffaroni e Jose Henrique Pierangeli
-Tratado
de Direito Penal- Cezar Roberto Bittencourt
Nenhum comentário:
Postar um comentário