terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Culpabilidade: Terceiro elemento do delito

CULPABILIDADE
            Quando determinada conduta é realizada, não basta que ela seja típica, antijurídica e reprovável, é preciso que haja um autor, que possa ser imputado, quando preenchido todos os requisitos de imputação, onde este tem sua conduta reprovável no sentido de que poderia agir em conformidade com o direito, mas assim não o fez. Não importa ainda se foi ação ou omissão, dolo ou culpa, é preciso possuir um sujeito onde se possa culpar. O conceito de culpabilidade foi passando por diversas conceituações, se iniciando com a ideia de culpa religiosa, onde o sujeito poderia optar pelo bem ou pelo mal, bem como pelas condutas contrárias ou de acordo com o direito. Aqui, se atrela um juízo de valor sobre o sujeito, uma responsabilização penal individual.
O conceito de culpabilidade usado em nosso sistema pode significar a expressão do princípio da culpabilidade (uma limitação do poder estatal em frente ao indivíduo), a culpabilidade como ideia de reprovação da conduta do agente e por fim, a culpabilidade como elemento da teoria geral do delito, que seriam as características do agente.
Conceito psicológico de culpabilidade: Ela tem influencia direta do positivismo jurídico e da necessidade de atribuir conceitos científicos á todas as ciências do Direito. Como no início era reconhecida como um livre-arbítrio, onde havia uma ligação muito forte entre moral e direito, essa ideia passou a ser substituída por uma teoria psicológica. A divisão da teoria geral do delito em injusto penal (objetivo) e culpabilidade (subjetivo) também contribuíram para isso. Ela atribui uma culpabilidade jurídica, onde o sujeito atua ou não antijuridicamente. Passa a terá algumas alterações, onde passou a ser visto como a ideia de imputação atribuída a uma relação de contrariedade entre a norma e o fato do homem. Com Von Lizst, traz a ideia de que há um lado objetivo (antijuridicidade) e subjetivo (dolo ou culpa), que liga então a conduta realizada pelo sujeito por um laço psicológico que seria essa vontade, esse querer e não querer dada pelo agente. Estes eram os elos psicológicos. Ela sofreu muitas críticas. A culpa inconsciente seria um problema, pois como não há a previsão, torna-se impossibilitado de você fazer uma ligação psicológica entre a conduta e o agente.
Conceito psicológico-normativo de culpabilidade: Passou de apenas uma ideia psíquica, passando a ter uma valoração jurídica, sendo focado então também na censura que pode ser feito diante da conduta daquele autor, sua reprovabilidade. A ideia de inserir uma norma era a valoração desses laços psicológicos (dolo e culpa). Dava de encontro à existência de uma norma jurídica e uma norma de dever. O descumprimento do direito implicava então um descumprimento ao dever. Pois aqui importava que houvesse a existência de uma norma, e além de dolo ou culpa, o agente deveria saber o que estava fazendo, deveria saber que estava agindo antijuridicamente, para que pudesse atrelar juízos de reprovabilidade de sua conduta.
Conceito normativo puro de culpabilidade: Surge de fases do neokantismo, onde afirmava que deveria existir um dever que seria o injusto e o poder de agir concretamente conforme o dever, que seria a culpabilidade. Questiona se o autor poderia evitar ou não o fato, onde a capacidade de evitar e não realizar tais atitudes caracterizaria uma conduta justa conforme o direito. Aqui, ele analisa a ideia de que há uma norma que imputa determinada responsabilidade se houver a realização da conduta, avalia-se subjetivamente a reprovabilidade de sua conduta, dirigida pela vontade, onde se questionará se o sujeito tinha potencial consciência da ilicitude e se havia uma exigibilidade de uma conduta diversa.
Estrutura: Dedica-se aqui, sobre a ideia de uma imputabilidade aplicada ao agente e sobre uma potencial consciência de ilicitude, onde a exigibilidade de conduta diversa é tratada como uma pretensão objetiva de ilicitude.
Imputabilidade: É o conjunto de características que tornam um sujeito capaz de ser atribuída responsabilidade por uma conduta ilícita cometida. Para poder reprovar a conduta de um sujeito, é preciso observar uma série de requisitos biológicos e psicossociais, para saber se o sujeito era capaz de compreender o que ele fazia. Primeiro se analisa a capacidade de intelecção e de compreensão da natureza ilícita de seu comportamento e segundo, a possibilidade de controle que permite atuar de acordo com sua compreensão.
Sistemas de Aferição: São sistemas onde implicam em aferir a imputabilidade em um sujeito. Estes podem ser:
Sistema biológico: Aqui, se questiona em tornar inimputável aquele sujeito que possui alguma anomalia psíquica, sejam por estados mentais patológicos desenvolvimentos mentais incompletos ou retardados e transtornos mentais permanentes ou transitórios.
Sistema psicológico: Este sistema se refere se o sujeito tinha uma ideia de compreensão do ato que estava realizando, onde ele age de acordo com essa compreensão.
Sistema bio-psicológico: é a junção das duas teorias para afirmar a imputabilidade, onde será, apenas aquele que possuem desenvolvimento mental incompleto ou retardado, e isso impossibilitar de ele compreender a sua conduta. É preciso que haja coincidência entre a presença da circunstância determinante de sua incapacitação, a falta de compreensão ou de determinação e a realização do ilícito.
Exclusão da imputabilidade por menoridade: Considera que o menor de 18 anos, não possui uma apreensão e compreensão de uma atitude ilícita, herdada pela teoria biológica, onde esse é a única exceção em nosso ordenamento. O que ocorre aqui, é que os menores de 12 anos são absolutamente inimputáveis, sendo uma presunção absoluta de imputabilidade, e os que se encontram em 12 e 18 anos, contando o dia que a pessoa completa os 18 anos, se considera opções de relativização da presunção de imputabilidade, necessitando de provas periciais por exemplo.
A exclusão da imputabilidade por doença mental e o desenvolvimento mental incompleto ou retardado: Aqui, trata de doenças mentais e desenvolvimentos mentais incompletos que atuam para que impossibilite o sujeito de ter capacidade de compreender que os atos que ele pratica são ilícitos. Ex: psicose maníaco-depressivo, esquizofrenia, alienação mental, paranoia, distúrbios obsessivo-compulsivo e formas de demência, além dos processos tóxicos crônicos que afetam o sistema nervoso central, associado a dependências químicas como alcoolismo e toxicomania.
Emoção e paixão: Essa ideia se refere sobre a imputabilidade a sujeitos que agem de violenta emoção ou extrema paixão. Antigamente, classificavam como sociais (amor, carinho, piedade, patriotismo) como formas de isentar da responsabilidade, e antissociais (como ódio, inveja, ambição), como formas de agravar a pena. Porém, esse entendimento foi desconstruído, onde passou a levar em conta, uma vez que não pode desprezar esses sentimentos humanos na hora de lidar com o caso, onde servem como causas de atenuantes e agravantes, de aumento e diminuição de pena, mas não de inimputabilidade.
Embriaguez: Ela é uma intoxicação aguda e transitória, derivada do álcool ou de tóxicos com efeitos análogos, onde impossibilitam o sujeito de ter compreensão de seus atos. Categoricamente, ela não afasta a imputabilidade, porém, há algumas exceções e hipóteses, que ela pode vir a tornar o sujeito inimputável.
Quanto à iniciativa do sujeito: Poder ser voluntária (o sujeito se embriaga por vontade própria), preordenada (o sujeito se embriaga para cometer um crime), culposa (quando o sujeito se embriaga, ultrapassando seus limites sem intenção) e fortuita (quando ocorre por força ou causa maior, alguém o embriaga, por exemplo).
Quanto aos graus de afetação dos sentidos: Incompleta (que implica o relaxamento dos freios inibitórios), completa (produz ausência de consciência e vontades livres) e comatosa (que produz a inconsciência, o sono profundo). Somente os sujeitos embriagados por caso fortuito ou força maior, derivada de uma força externa, onde ele não consegue ter controle de seus movimentos, de conhecimento e da vontade de realizar aquilo, que ocorre a inimputabilidade. Se houver um resquício de compreensão, o sujeito pode vir a ser penalizado. O ébrio habitual é tratado no rol dos inimputáveis, pois está equiparado como uma doença mental.
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.
 Parágrafo único - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.

Art. 27 - Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.

Art. 28 - Não excluem a imputabilidade penal:
I - a emoção ou a paixão
        II - a embriaguez, voluntária ou culposa, pelo álcool ou substância de efeitos análogos.
        § 1º - É isento de pena o agente que, por embriaguez completa, proveniente de caso fortuito ou força maior, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento   § 2º - A pena pode ser reduzida de um a dois terços, se o agente, por embriaguez, proveniente de caso fortuito ou força maior, não possuía, ao tempo da ação ou da omissão, a plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento.


Potencial consciência da ilicitude ou conhecimento do injusto: É inacessível compreender o que passa na cabeça do sujeito que sofre uma imputação, desta forma, o direito passa a estudar apenas possibilidades de compreensão. Quando falamos sobre uma potencial consciência da ilicitude, é que há uma possibilidade do sujeito ter o conhecimento que aquela conduta é ilícita. Isso não se refere a ele conhecer de forma afirmativa que conhece a lei, por exemplo, mas pela análise da possível compreensão que ele tem de agir contra o direito, que reside a ideia de ele potencialmente saber o que é ilícito. É através disso que ocorre a reprovação de sua conduta e o direcionamento da imputabilidade.
Objeto de conhecimento: Diversas são as correntes que discutem sobre o objeto da consciência da ilicitude:
Antijuridicidade formal: Onde acredita que o objeto, é o sujeito saber que existe uma lei que é contrária a aquela conduta delitiva praticada. Aqui, traz sérios problemas, uma vez que os indivíduos conhecerem todas as leis é parte de uma ficção, pois nem mesmo todos os juristas conhecem todos os dispositivos, e desta forma, somente um grupo minoritário de operadores do direito não seriam punidos, o que implica um Estado totalitário e não condizente com um Estado democrático de direito.
Antijuridicidade material: Aqui o sujeito compreende que sua conduta é antissocial, ou seja, ela é reprovável no seio social, que caracteriza a materialidade da conduta. Os valores que influenciam no mundo jurídico, a consciência ética que se liga ao mundo jurídico, contribuem para essa compreensão, bem como a produção de uma ofensa jurídica.
Há a teoria que fala a respeito da existência da antijuridicidade formal e material. Quando ocorre uma falta de potencialidade da consciência de ilicitude, onde deixa claro que o sujeito não consegue compreender a ilicitude de sua conduta e a reprovação de suas atitudes para designar um erro de proibição, onde pode levar á impunidade ou a uma redução de pena.
Exigibilidade da conduta diversa: Se questiona se em tal momento, o sujeito poderia agir diferente da maneira que agiu. Se observar que ele realizou tal conduta, com possibilidade de agir de forma diversa daquela, há a reprovabilidade e há a infração penal.
*Hipóteses de exclusão da exigibilidade da conduta diversa*
 Art. 22 CP - Se o fato é cometido sob coação irresistível ou em estrita obediência a ordem, não manifestamente ilegal, de superior hierárquico, só é punível o autor da coação ou da ordem.

Coação moral irresistível: Aqui trata da coação moral, ameaça de alto grau e nível de reprovabilidade, onde o sujeito não poderia se negar a realizar aquilo, pois o coator era capaz de cumprir aquela coação irresistível, pois esta ao alcance dele. Considera também, aquela coação grave e iminente, o que pode causar graves males ao coagido.
Obediência hierárquica: Aqui trata em uma relação apenas de direito publico, com relação de subordinado e superior, onde quando trata do cumprimento de uma ordem ilegal e não manifestamente ilegal, pois isso excluiria a antijuridicidade e quando cumpre algo ilegal com obediência ao superior, exclui a culpabilidade.

CAUSAS SUPRALEGAIS DE CULPABILIDADE
As causas de exculpação podem se compreender pelo:
Fato de consciência: Aqui entram em jogo valores morais e religiosos que influenciam diretamente nas tomadas de decisões que acabam afetando o mundo penal. Este é um direito protegido constitucionalmente, de exercer livremente o direito a crença.
Provocação da legítima defesa;
Desobediência civil: Quando se unem e se rebelam em prol de direitos coletivos, ou há demonstrações de bloqueios e ocupações em defesa do bem comum.
Conflitos de deveres:


*Co-culpabilidade: Advinda do direito penal socialista, aqui afirma que no momento que direcionamos nossa conduta, nós temos uma autodeterminação já em mente. Porém, nem todas as pessoas possuem a mesma oportunidade, onde alguns, por falta desta, direcionam sua conduta por falta de meios autodetermináveis. Assim, não pensamos na conduta do sujeito para culpa-lo, mas pensamos no histórico de vida dele, nas vezes que o Estado e a sociedade foram omissos com ele.

Deve haver uma relação de causalidade entre a conduta injusta e o resultado, bem como um nexo entre o sujeito culpável e o seu resultado. Deve também sempre observar se foi determinada conduta que gerou o resultado.
*Aspecto subjetivo: Decorre do finalismo, e se questiona se houve dolo ou culpa, se houve previsão.
Resultado Naturalístico: Advém da vertente causalista, da ideia de voluntariedade, vontade de haver um resultado natural. Esse resultado significa ver se houve uma conduta que provocasse uma modificação, uma alteração física exterior. Há a exigência de sua comprovação no processo, com a ideia de haver relação entre um sujeito culpável e o resultado.
Resultado jurídico: Caracterizado como uma ofensa ao bem jurídico. Todas as condutas geram uma ofensa ao bem jurídico, mas nem todas produzem um resultado naturalístico.
Art. 13 CP - O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido
Há a verificação de que é aquela conduta que deu causa a existência do resultado e não causas passadas que intervém para que haja sua consumação.
*Teoria das equivalências das condições: Não é utilizada, porque aqui ela remonta á todas às causas passadas que influenciam indiretamente para que haja a consumação do resultado. Ex: Culpar o vendedor de armas, por ele ter vendido arma para alguém que cometeu homicídio. Para frear a paranoia estabelecida, cria-se um juízo hipotético de eliminações, onde analisam todas as condutas existentes diretas e indiretamente naquele resultado e vão eliminando aquelas que não contribuíram diretamente para a consumação do resultado.
*Da Causalidade adequada: Considera apenas causa ação ou omissão, aquela apta e idônea para gerar aquele resultado.
*Imputação Objetiva: Aqui fala, para que a conduta seja possível para ser culpada, é aquela ação ou omissão onde cria um risco intolerável ao bem jurídico, o resultado não iria ocorrer de outra forma se não tivesse ocorrido isso e a vítima não pode ter contribuído para isso.

*Plano de execução: Desdobramento normal: O plano de execução é aquele iter criminis, composto do cogitatio, atos de preparação e atos de execução, sucedida da consumação ou exaurimento. Esse plano de execução tem como tendência se desenvolver normalmente, porém há situações que interferem para que ele não se realize e são chamadas de concausas.
Elas podem se dar por força maior ou causa fortuita bem como o agente responde pelos atos até então praticados. Elas podem ser:
Absolutamente independentes: São causas onde o resultado é produzido antes da finalização do plano de execução. Aqui o sujeito responde pela tentativa da ação. São concausas que não possuem relação com o plano de execução, produzem sozinhas o resultado e rompem o nexo causal existente entre a conduta do agente e o resultado que se produz. Resumidamente, o resultado ocorre independente do seu plano de execução, dos meios empregados.
Relativamente independentes: Por via de regra, elas não possuem força para produzir o resultado. A soma das concausas existentes pode vir a produzir um resultado naturalístico. Elas podem ser:
v  Preexistentes: São concausas relativamente anteriores ao plano de execução. Você tem o plano, mas há situações anteriores ao plano de execução. Nesse caso, ele responde pelos resultados praticados e não apenas pelos atos que praticou.
v  Concomitantes: São concausas que ocorrem no mesmo tempo, deve haver comprovação de que essas situações ocorreram no mesmo momento da execução do seu plano. Se estas não forem provadas, responde como se fossem absolutamente independentes. Se provado, responde pelo resultado naturalístico, se não provar, cai como concausas absolutamente independentes, onde se responde pela tentativa.
Ex: Envenenamento e infarto/AVC=Ocorrem no mesmo tempo.

Supervenientes: Não se usa a teoria da equivalência das causas.
Estas são tratadas de forma diferente no código. Descobre se o fato superveniente é o que causou o resultado. Para descobrir, se estuda a teoria da causalidade adequada, o que foi a causa definitiva da morte, por exemplo.
Quando o fato causa o resultado, o sujeito só responde pelos atos até então praticados.
Ex: Atropela vítima e essa é atropelada pela ambulância.

Bibliografia utilizada: Manual de Direito Penal Parte Geral -Paulo Cesar Busato.

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